Prólogo
Por séculos a humanidade tentou buscar um equilíbrio em suas vidas, tendo seus destinos bem classificados entre céu e inferno. Para o céu iriam as pessoas virtuosas, para o inferno iriam apenas os pecadores.
Anjos criaturas puras, boas, magnânimas, belas; demônios seres impuros, maldosos, corrompidos e horríveis.
Dentre esses opostos tão gritantes, a humanidade almejava o céu e temia o inferno, fazendo a própria vida um purgatório, onde podiam pecar, se arrepender e buscar perdão.
Nenhuma alma fugia do julgamento final, depois da morte a alma iria conhecer seus juízes, anjos e demônios. Ela ia descobrir naquele momento as regras e a dura realidade daquele tribunal.
Na hora de sua morte, seus pecados, suas virtudes, todas suas ações em vida, tudo era exposto na frente daqueles juízes.
Eles eram sempre três, um anjo, um demônio e um balança. Os três foram criados pelo Ser máximo do céu e o Ser máximo do inferno, porém como todos anjos e demônios que tinham que respeitar certas regras, os juízes tinham apenas uma regra: respeitar o livre arbítrio daquela alma.
Eles podiam observar, até se envolver, mas nunca desrespeitar a única regra que tinham.
A punição para o juiz que infligia aquela regra era o exilio. Rejeitado pelo céu e pelo inferno, aquela criatura iria vagar pelo mundo mortal sem nunca ter uma segunda chance, sem ter o benefício do fim.
O anjo julgava as sete virtudes: castidade, caridade, temperança, diligência, paciência, bondade e humildade. Já o demônio julgava os sete pecados: soberba, inveja, ira, preguiça, gula, avareza e luxuria.
O balança era responsável pelo equilíbrio, a equidade, a justiça muitas vezes injusta, capaz de sustentar aquele delicado equilíbrio entre os dois. Função essa que entre os três era considerada a mais difícil.
No seu último julgamento, as regras eram simples, mas o resultado poderia ser surpreendente.
Nanah – Juiz demônio
Entre os três juízes a mais antiga, a única criada para exercer aquela função desde a existência do mundo.
Porém, ela nem sempre foi o demônio, criada para ser o anjo, ela serviu como juiz anjo por muito tempo, até que por livre espontânea vontade ela decidiu trocar o céu pelo inferno. Uma criatura meiga e gentil, que via beleza no caos.
Dona de uma personalidade alegre e travessa, ela era a personificação da frase: as aparências enganam.
Por séculos ela observava de longe os homens lutarem contra seus desejos, evitando pecar, aquela tortura para ela era divertida, porém em algum momento observar não era mais o suficiente para ela, ela viu a necessidade de se envolver.
Dizem que quando os Deuses querem te amaldiçoar eles concedem seus desejos. Essa frase foi inspirada nela.
Como uma pessoa iria se comportar quando soubesse que não importaria o que ela fizesse na vida, ela iria para o inferno de qualquer jeito?
Se a pessoa tivesse a escolha, se vingar e ir para o inferno, ela iria escolher a vingança ou esperar a “justiça” divina?
Qual é o preço que a pessoa daria para a própria alma?
Com tantas perguntas, ela viu uma oportunidade maravilhosa de se divertir. Afinal para ela, tudo ficava muito mais prazeroso com um pouquinho de desespero.
Com uma imagem meiga, reconfortante e sempre com um sorriso no rosto ela oferecia “ajuda” para quem buscava desesperadamente vingança.
“Se você fizer um contrato comigo eu vou aliviar sua dor, vou executar sua vingança e irei mandar aquela pessoa imediatamente para o inferno, porém tudo tem um preço. Você também irá para o inferno, mas eu só venho te buscar quando você morrer. Quer fazer um contrato comigo?”
Dessa forma, por séculos as pessoas se socorriam a ela, os anjos nada podiam fazer, afinal ao ser humano foi dado o livre arbítrio e esse direito ela respeitava, nunca obrigando ninguém a nada e sempre seguindo sua única regra: a pessoa enviada imediatamente para o inferno tinha que cometer um dos setes pecados capitais.
Sua popularidade aumentou, conforme os anos passaram várias lendas sobre uma garota que levava as pessoas para o inferno surgiram.
Surpresa com a alta demanda de vinganças, ela começou a ficar com preguiça e tédio, ela queria o caos, ela admirava o desespero, mas estava sendo muito trabalhoso, ela pensou em voltar para o seu mundo e deixar a humanidade a própria sorte como antes, mas seria um desperdício muito grande, ela tinha um objetivo.
Criativa e com a mente voltada para o mal, ela achou uma solução.
Ela começou a buscar pelos piores, buscar por sete humanos que eram os melhores em seus pecados. Para esses humanos maravilhosos, ao olhar dela, ela iria fazer uma proposta:
“Eu te ofereço eternidade, poderes e você só precisa trabalhar para mim para sempre. Seu trabalho? Executar as vinganças para eu ir buscar as almas. Aceita?”
Até o momento ela encontrou apenas três pessoas dignas de receber essa proposta, sem surpresa, as três aceitaram. Eles eram: Lixo, soberba; King, ira; Andry, inveja.
Agora esses quatro trabalhavam juntos com o propósito de trazer diversão, prazer, caos e, principalmente, vingança para quem os procurava.
“Quer fazer um contrato com a gente?”
Akachi – Juiz anjo
Ele antes de ser um juiz era conhecido entre os anjos como a mão de Deus, o favorito dos arcanjos, ele substituiu Nanah, quando ela decidiu trocar de lado.
Sempre sério, dono de uma personalidade forte e determinada, ele exercia sua função com excelência. Olhava com carinho e empatia os seres frágeis, lamentava todas as provações que a vida mortal apresentava, mas não se deixava abalar quando via que na balança final, ele iria perder.
O caminho do céu não era para qualquer um, o merecimento era obrigatório e quando ele entrava para julgar uma alma ele era implacável. Ao olhar dele apenas os melhores eram dignos do céu.
Durante toda sua existência, poucas vezes se envolveu no mundo humano, diferente de Nanah, ele não tinha interesse em dar atalhos para o céu, ele não acreditava nisso, porém em raras ocasiões ele dava a uma alma agonizante um momento de esperança.
Akachi nunca esqueceu do momento que recebeu sua função, sendo um anjo subordinado do Arcanjo Miguel, ele recebeu com respeito e honra a nova posição.
- Você será o novo juiz dos anjos no tribunal. – Miguel fala de forma séria.
Naquele momento, todos no reino do céu e do inferno sabiam que o tribunal estava incompleto, ninguém sabia ao certo o que tinha acontecido dentro do tribunal, já que aquele ambiente estava fora dos domínios tanto dos arcanjos como dos príncipes Demônios.
Os únicos que sabiam exatamente o que acontecia no tribunal, eram os três juízes e o Ser máximo do céu e o Ser máximo do inferno. Porém, especulações existiam, a teoria mais aceita era que o juiz demônio tinha corrompido o juiz balança, forçando o desequilíbrio, abalando o livre arbítrio.
O que ocorreu, como aconteceu e o que motivou tais atos ninguém de fora sabia, porém as consequências todos sabiam, o juiz demônio e o juiz balança foram expulsos para o exilio, perdendo suas funções e deixando o tribunal incompleto.
Porém, algo surpreendente aconteceu, diferente do que todos imaginavam, a função de juiz demônio não ficou vaga, já que a juiz anjo escolheu trocar de função. Uma decisão que chocou a todos.
Um anjo corrompido, não era uma anormalidade, porém um juiz corrompido era algo que ninguém aceitava, nem os anjos nem os demônios.
Como um juiz poderia continuar exercendo sua função se ele já tinha sido corrompido?
Independe das opiniões externas, a decisão foi aceita pelos Seres superiores e ninguém poderia ser contra. Dessa forma, o Ser máximo do céu, pediu aos seus arcanjos que escolhessem um anjo para ocupar a função de juiz anjo.
Miguel, o arcanjo protetor, responsável por defender o reino do céus, dos demônios, humildemente disse que poderia abrir mão da sua função de arcanjo para assumir a de juiz.
- Não, eu o criei para ser um arcanjo, não para ser um juiz. – O Ser máximo do céu respondeu.
- Senhor, eu o respeito acima de tudo, mas a função de um juiz é algo muito importante e uma responsabilidade enorme, se nem os criados para isso foram capazes de exercer tais funções, como podemos escolher alguém abaixo de nós? – Miguel argumenta.
- Nossas criações nunca foram perfeitas, porém cada criação é única e possui sua função, a sua função é de arcanjo e nunca será de juiz, você não pode mudar isso.
- Mas se as funções não podem ser mudadas, como ela mudou? – Miguel pergunta.
- Ela não mudou de função, ela foi criada para ser um juiz, ela continua exercendo a função para qual ela foi destinada a ocupar, o tribunal. O dom da criação é único, não pode ser repetido, porém circunstancias adversas nos forçam a nos adaptar, dessa forma duas posições se tornaram incompletas, o tribunal precisa de um juiz balança e de um juiz anjo, mesmo que esses não forem criados para tais funções, eles podem se adaptar, porém para tal adaptação não é certo retirar uma criação que está perfeitamente em sua função, no caso você. Por conta disso, eu venho a você, meu arcanjo protetor, pedir uma recomendação. – O Ser explica com eloquência e plenitude.
- Dessa forma, eu vou recomendar o anjo Akachi.
- Então assim será, o anjo Akachi irá ocupar a função de juiz anjo, deixo a você a responsabilidade de informa-lo e instrui-lo. Lembre-o que o tribunal é um ambiente a parte do céu e do inferno.
- Como posso instrui-lo se nem eu sou capaz de compreender perfeitamente como o tribunal funciona?
- Instrua-lo a fazer o bem, olhar com gentileza e carinho pelas almas que ali adentram, instrua-lo principalmente a ser forte. A justiça do tribunal pode ser incerta, manter-se no caminho certo é uma tarefa difícil e árdua a todos, mas dentro do tribunal isso se torna ainda mais difícil, pois os juízes são expostos constantemente a situações adversas, o desvio, a tentação, a corrupção flerta com os juízes a todo momento, e o destino de um juiz corrompido é o exilio.
- Se o destino é o exilio, por que apenas dois dos juízes foram exilados? Ela foi corrompida também.
- O que aconteceu dentro do tribunal diz respeito apenas a mim, a Ele do inferno e aos três juízes. Não tente entender, não cabe a você.
- Perdão. – Miguel mostra respeito. – Eu vou informar Akachi.
Depois daquela conversa, Miguel foi informar Akachi sobre sua nova função.
- Eu vou ser um juiz? – Akachi recebe a notícia com espanto.
Existia uma hierarquia no mundo, acima de todos anjos existiam os arcanjos, semelhante aos arcanjos existiam os juízes, nunca foi definido quem estava acima, o arcanjo ou o juiz, porém independente de quem estava acima de quem, os dois estavam muito acima de um anjo.
- Sim. – Miguel responde sério.
- Eu me sinto honrado, mas não acho que seja capaz de tal função. – Akachi responde com humildade.
- O Ser máximo me pediu uma indicação, eu confio no seu potencial, você sempre exerceu a função que eu te dei muito bem, eu acho que você será capaz de assumir essa posição.
- Mas eu fiquei sabendo que apenas o juiz balança e o juiz demônio foram exilados, por que estou assumindo uma posição que já possui um dono? O que aconteceu com a juiz anjo? – Akachi continuava confuso.
- Ela agora é a juiz demônio. – Quando Miguel responde Akachi arregala os olhos. – Não cabe a nós julgar as decisões dos Seres superiores, eles aceitaram essa decisão e a nós cabe apenas respeitar.
- Mas você mestre o que o senhor acha, eu preciso saber o que esperar dentro do tribunal, você conheceu os três juízes? Conheceu ela?
- Eu nunca conheci os outros dois juízes, eu a conheci, porém nunca fui próximo, ela sempre foi uma criatura diferente. – Miguel responde sério e pensativo.
- Diferente?
- Sim, ela sempre se comportou de uma forma diferente, aos meus olhos as vezes era até estranha, porém eu sempre atribuí isso ao fato dela conviver constantemente ao lado dos outros juízes, principalmente do juiz demônio, que era um ser muito respeitado e até aclamado no reino das sombras. – Miguel parecia pesaroso. – Eu nunca imaginei que a postura diferente dela fosse uma discreta demonstração de sua corrupção.
- Corrupção? – Akachi parecia preocupado.
- Ela é um anjo corrompido, ela escolheu mudar de lado, abandonou o caminho do bem e optou pelo mal. – Miguel fala sério. – Por isso Akachi, mesmo que ela seja um juiz original, não se deixe intimidar e também não confie nela, ela traiu a própria origem. Eu não sei o que aconteceu naquele tribunal para as coisas acabarem assim, mas eu confio que você não deixará isso acontecer novamente, temos que proteger o caminho do céu, o juiz anjo precisa ser forte. Eu confio na sua capacidade, acredito na sua força, sei que não estou te dando uma função fácil, lamento por isso.
- Não mestre. – Akachi respira confiante e corajoso. – Não lamente, eu vou proteger o caminho do céu, não sei direito o que me espera dentro do tribunal, mas eu vou ser forte.
- Eu acredito nisso. – Miguel sorri elegante.
Depois daquele dia Akachi assumiu a função de juiz anjo, respeitando o livre arbítrio de todos, ele apenas observava se aquela alma iria ter esperança ou se corromper pela dor. Sempre seguindo as orientações de seu arcanjo mestre, sendo a força inabalável que o céu precisava ter, diante de todas as tentações que o mundo oferecia.
Imamu – Juiz balança
Portador da balança, a função do juiz balança nunca permaneceu por muito tempo com um ser, uma vez que sua responsabilidade muitas vezes acabava corrompendo aquela criatura o fazendo acabar no exilio.
Nanah já tinha visto cinco juízes balança, Akachi quatro. Imamu era o atual, escolhido pelo céu e pelo inferno, ele antes de ser um juiz era um ser espiritual.
Imamu era um bom líder, paciente e justo, conseguia equilibrar a balança com competência e seriedade, mesmo sentindo o peso que ela tinha.
Ele sabia que a justiça daquele tribunal podia ser injusta aos seus olhos e para assegurar a imparcialidade, quando assumiu o posto de juiz ele vendou seus olhos, para nunca se sentir tentado a interferir.
Optou pelo isolamento, nunca mais observando o mundo mortal depois que assumiu a função de juiz balança. Ele apenas convivia com os outros dois juízes, Akachi e Nanah. Se esforçando ao máximo para adquirir conhecimento para manter a balança equilibrada, preservando a equidade e a imparcialidade.